Uma crise silenciosa de saúde pública está se consolidando no Brasil, com consequências que podem impactar gerações futuras: a obesidade infantil avança em ritmo alarmante. Dados compilados de diversas fontes governamentais e de saúde pintam um quadro preocupante, revelando que o excesso de peso já é uma realidade para uma parcela significativa de crianças e adolescentes no país, com a pandemia de Covid-19 atuando como um forte acelerador desse processo.
O Panorama em Números
As estatísticas são contundentes e revelam a dimensão do problema em diferentes faixas etárias:
- Crianças de 5 a 9 anos: Dados do Sistema Único de Saúde (SUS) mostram que 13,2% das crianças nesta faixa etária já são consideradas obesas, enquanto 28% apresentam excesso de peso. De forma mais ampla, estima-se que 3 em cada 10 crianças brasileiras de 5 a 9 anos estão acima do peso ideal.
- Adolescentes de 10 a 18 anos: O cenário é ainda mais grave. Um levantamento do Observatório de Saúde na Infância (Observa Infância – Fiocruz/Unifase) aponta que um em cada três adolescentes brasileiros (cerca de 33%) estava com excesso de peso em 2022.
- O Impacto da Pandemia: O período de isolamento social entre 2019 e 2021 teve um efeito devastador. O número de crianças com até 5 anos com excesso de peso cresceu 6,08%, enquanto entre os adolescentes o aumento foi de impressionantes 17,2%.
- Projeções Futuras: O Atlas Mundial da Obesidade projeta que, se nada for feito, o Brasil ocupará a 5ª posição no ranking global de países com o maior número de crianças e adolescentes com obesidade até 2030.
Riscos, Causas e Recomendações
Especialistas alertam que a obesidade infantil não é apenas uma questão estética, mas uma condição médica grave associada a riscos metabólicos, hormonais e cardiovasculares que podem se manifestar precocemente. O excesso de gordura pode, inclusive, provocar alterações hormonais que antecipam a puberdade. Além disso, uma criança obesa tem uma probabilidade muito maior de se tornar um adulto obeso, aumentando o risco de desenvolver doenças crônicas como diabetes tipo 2, hipertensão e problemas cardíacos ao longo da vida.
As causas são multifatoriais e incluem uma dieta inadequada, com alto consumo de alimentos ultraprocessados, e o sedentarismo, que foi drasticamente agravado pela mudança de rotinas e pelo aumento do tempo de tela durante e após a pandemia.
Diante deste cenário, médicos e especialistas reforçam a importância da prevenção e do acompanhamento contínuo. A endocrinologista pediátrica Patrícia Amorim explica que exames como hemograma completo, glicemia de jejum e perfil lipídico podem ser indicados mesmo em crianças sem sintomas aparentes, especialmente se houver histórico familiar de obesidade. A orientação para as famílias é clara: incentivar a prática regular de atividades físicas e adotar uma dieta baseada em alimentos frescos, como frutas, verduras e legumes, enquanto se reduz drasticamente o consumo de ultraprocessados, bebidas açucaradas e fast food.
A pandemia de Covid-19 pode ter arrefecido, mas suas consequências secundárias estão apenas começando a se manifestar de forma clara nos dados. A crise de obesidade infantil é uma dessas heranças, um problema de saúde pública que exigirá políticas integradas e um esforço conjunto de governos, escolas e famílias para ser revertido, sob o risco de sobrecarregar o sistema de saúde por décadas.